terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Escutar

Hoje é um daqueles dias em que é preciso ouvir mais. Todos e principalmente a voz interior. Escutar mais dos que estão e daqueles que já foram embora, mas deixaram um eco pairando nos meus silêncios e dúvidas. Um brinde ao dom de escutar.
O cotidiano é lindo e trabalhoso, ainda mais do que possa parecer. Talvez menos problemático para pessoas mais pragmáticas. Talvez os pragmáticos só estejam passando por cima dos hiatos diários com facilidade. Que seja. Ouvir é o dom de cavar no caos um espaço de diálogo. Há possibilidade de causar encontros e mudanças do silêncio.
Ouvir é dar espaço para encontrar o que há de mais fundo dentro de você e escapole por aí em meio às falações diárias. É convocar as vozes que me acolhem para participar das dificuldades de cada dia; é prestar atenção ao redor e descobrir eu mesma. Que seja. A poesia do silêncio sempre grita mais forte do que possa parecer. Ainda mais forte do que um berro qualquer.
Hoje é um daqueles dias bons para praticar o silêncio de si e a escuta do mundo. Primeiro, porque os encontros no diálogo precisam de espaço para cavar possibilidades. Segundo, porque, parando para escutar, consigo ouvir melhor a minha própria voz; garanto.
Que seja. A abertura para o silêncio promove espaço nesse caos diário. Escuto mais a poesia do cotidiano. O mundo se desdobra em versos e ouço vozes. Um brinde aos sons diversos; um brinde ao mundo.

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Olhar

Quero falar sobre a importância do olhar em nosso cotidiano. E sobre as escolhas que fazemos em observar certas coisas e ignorar outras. Penso que a forma como escrevemos também é um olhar para o mundo. Agora, por exemplo, estou construindo uma visão.

Ao abrir os olhos, recortamos imagens e formamos filmes únicos em nossas vidas. Acredito que nenhum olhar é igual, mesmo que seja para a mesma coisa, olhada pela mesma pessoa. Cada um de nós filma sua vida de jeito próprio. E, preciso dizer, a junção desses vários olhares para o mundo ajuda a construir cada vez mais aquilo que somos, que queremos ser e que constitui a sociedade.
As escolhas que fazemos de observar certas coisas, aquilo que vislumbra ser mais convidativo aos olhos, são escolhas para nos formar. Aos poucos, no cotidiano de cada dia, as imagens que recortamos do mundo apresentam as nuances das cores. Ou, se optarmos por um olhar menos detalhista, as imagens que vemos revelam o tom único de quem não deseja se aprofundar no arco-íris.
Mas, não se engane, olhar não é sempre aquilo que não é visível. Como na frase de um livro famoso: "O essencial é invisível aos olhos...". Há diversas maneiras de abrir esses olhos - seja pela palpébra, pela escrita, pelo coração, pelo barulho da chuva caindo lá fora, pelo cheiro gostoso de amora, pelo gosto bom do pão-de-queijo da avó ou o que seja. Olhar são as escolhas que fazemos com nossos sentidos para produzir um filme diário.
As palavras que escolho nesse momento ao fazer esse texto são uma visão única para algo que poderia ser escrito de inúmeras maneiras. Aqui, produzo uma imagem, um recorte da história. Estou construindo essa história. E se você escolheu lê-la também está olhando o mesmo filme. Mas talvez já esteja produzindo outra imagem.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Caminhar

Caminhar é uma das coisas mais difícieis para alguns. Não estou cambaleando nessa afirmação. Minhas palavras não consistem no significado das linhas apenas. Desde pequena aprendi a ler entrelinhas. Caminhar, até hoje estou tentando.
As pernas devem estar firmes e aguentar o peso do corpo. A direção é designada previamente. O sincronismo deve estar perfeito. E daí, realidade e sonho se juntam em harmônia formando o caminhar. Faz parte andar no presente levando alguma bagagem do passado e um mapa para o futuro. E, claro, sem se esquecer das pedras no meio do caminho. As pernas devem ser firmes e se sustentar.
Nem os textos nem os caminhos sugerem apenas linhas retas. Meus pés não estão alienados e andam. São, assim, curvas e entrelinhas e atalhos e significados e mais ruas do que mapas. É preciso ter cuidado para os sonhos não se esconderem em guetos. Sempre estar atento para não perder de vista a realidade. Desse modo, desde pequena eu e mais alguns por aí nos empenhamos ao máximo para caminhar firme nas curvas. Meus pés atentos aos significados. minhas palavras desviando das pedras.
Caminhar é um ato reinventado a cada dia. Os pés seguem através do presente, futuro e passado; entre sonho e realidade; no meio de pedras e curvas. As entrelinhas sugerem a harmonia sutil que garante firmeza ao corpo. Desde pequenos tentamos não cambalear no cotidiano.

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Banho

Entre o ainda estou sonhando e o acabei de acordar, cabe um banho para começo de conversa. A água que bate no corpo soa como despertador d'alma. Para os que acreditam no poder do ritual, segue o higiênico banho da manhã.
Já me contaram, mais de uma vez, que foram os índios aqueles cuja cultura nos fez herdar o banho diário. Também já ouvi falar no fato de que nossos amigos portugueses e demais europeus não tinham o mesmo hábito. O que, fofocas só cá entre nós, me faz pensar em como era o cheiro deles (ou quanto de perfume era preciso).
Antecedentes históricos de lado, não busco escrever sobre o papel higiênico do banho. Mas, sim, sobre o alarme automático que a água toca quando ainda estamos perdidos em um quê de fantasia inconsciente. Ou seja: " Acorda, vagabundo, é hora de trabalhar". Nem sempre nessas palavras, o despertador pode ser mais amoroso: "Acorda, querido, hoje vamos passear de navio pelas Ilhas Gregas". Enfim, o banho te acorda para a vida. Por esse motivo, o considero um importante detalhe nesse cotidiano de cada dia. Embora algum Cascão possa ter opiniào contrária.
Sabonete, shampoo, água e muita água para tentar garantir que tudo isso é realidade. Infelizmente ou felizmente, a hora de sonhar já passou e daqui por diante a energia está voltada para os desafios da existência humana. Seleção natural, trabalho, comidas estranhas em restaurantes e programas debilóides na TV. O banho pode ser fortificador; acreditando no seu potencial, ele te sustenta nos turbilhões de carros de uma manhã engarrafada, se for preciso.
Entre o ritual de todo dia - água, sabonete, televisão, seleção natural - e a higiene d'alma, cabe mesmo um banho de hábito ao abrir os olhos. Não sei se é um ato sempre utilizado na história humana. Mas, parece ser um toque eficaz para o despertador.


Me banho dessa chuva insana
Que perdeu a hora e atrapalha meu sono.
Ainda nem sei se é hoje ou amanhã.
Mas sei que acordei
E as gotas são fortes na janela.

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Acordar

Acordei. Fato isolado que sublinha o meu dia. Mais um céu, mais um sol, coisas e coisas para acontecer ou deixar de acontecer. O cotidiano desabrocha e, olha lá, quando vejo, o relógio já me expulsa esse pensamento. É hora de agir.
O contorno do meu tempo é esse eterno adormecer e despertar que, às vezes, chega a agredir um relógio aqui dentro que nem sempre bate com a hora. Quero dizer, o tempo não concorda com os meus quereres. Mas, os meus quereres sempre acabam se confrontando com o tempo.
Levantei da cama. acordar e se manter nesse estado reflete uma iniciativa um tanto contente de progredir, de uma forma ou de outra. Mesmo que possa haver o momento em que acordar não queira dizer levantar e sim se lembrar de dormir novamente. Resistir ao poder do aconchego do sono é o que te levanta da cama. Acorda, amor.
Viver pode ser continuar esse eterno cotidiano de surpresas diárias até que, um dia, dormimos para sempre. Deve ser quando o relógio para, mas nunca para o mundo. O mundo mundo vasto mundo ainda segue no cotidiano de cada dia. Acordar. Levantar da cama. Vou contente seguir um tempo de surpresas cotidianas. Mesmo que seja perceber que o despertador ainda não tocou.
Acordei. Fato isolado que sublinha a vida. Criei coragem, despois de alguns tic-tacs monótonos, e me surpreendi ao fazer esse blog. Minhas palavras desabrocham e, olha lá, quando vejo, o meu texto se espalha além do ritmo esperado. Enfim, levantei da cama.